Bucareste fora da rota turística: depois de te mostrar que a capital da Romênia é uma incrível cidade, uma jóia do leste europeu que ainda não foi descoberta pelas massas, que é barata, que tem lindos prédios em estilo art nouveau parisiense do período monárquico, um centro antigo cheio de lugares escondidos, muita história relacionada ao período comunista e até um parque aquático com spa, agora te apresento as atrações em Bucareste para os verdadeiros exploradores!
Como eu já contei no roteiro de 4 dias em Bucareste, uma das melhores formas de visitar a cidade é com os walking tours, que são gratuitos ou bem baratos e valem a pena por toda a informação que trazem e por ser muito fácil circular a pé pela cidade. Aqui nesse post vou falar de três desses walking tours que simplesmente amei. Eles são diferentões e acho que vale a pena fazer depois dos tours clássicos que indiquei no roteiro de 4 dias em Bucareste, mas se você for do tipo que gosta de mergulhar mais fundo, vai ser uma ótima oportunidade de conhecer Bucareste por outros pontos de vista.
Vou falar do Rroma Heritage Tour, que tenta desvendar a história dos ciganos, do Alternative Tour que assim como o anterior é feito pela Open Doors Travel e te leva numa imersão pelo mundo da street art, e do Jewish Trail feito pelo Jewish Tour of Bucharest, que conta um pouco da história dos judeus na Romênia. Vem junto!
Bucareste Fora da Rota Turística: Rroma Heritage Tour
A proposta desse tour é tentar mostrar um pouco quem são e qual a história dos ciganos que vivem na Romênia. Eu me interessei pelo tour porque o que eu mais ouvi quando disse que ia para lá eram perguntas sobre os ciganos.
Apesar de serem originários do norte da Índia, muitas pessoas associam os ciganos à Romênia e há quem acredite que toda a população romena é cigana, quando na verdade eles são uma minoria. Há outros países da Europa que possuem uma população de ciganos do mesmo tamanho ou maior que a da Romênia e até o no Brasil existe um número similar de ciganos.
Mas também é inegável que esse povo tem uma importância histórica para o país e merece ser conhecida. O pequeno problema é que os ciganos não gostam muito de fazer registros de suas vidas, lendas, músicas e não é tão simples fazer esse resgate. Para completar ainda sofrem muito preconceito, a começar pelo nome pelo qual são chamados, “cigano”, que não é o nome pelo qual eles se denominam como povo que é rroma. Os romenos tem feito um esforço para diminuir o preconceito e uma das medidas é respeitar a forma como querem ser chamados.
Junto com o guia Stefan embarcamos de tram para um bairro mais afastado do centro e que é habitado predominantemente pelos rroma. Aos poucos ele foi nos contado como os rroma estavam inseridos na sociedade hoje (mal) e como foram tratados no passado (muito mal). Basicamente, na Romênia os rroma tem a mesma fama que em boa parte do mundo. São tratados como ladrões, traiçoeiros, pobres, em resumo: cidadãos de segunda classe, empurrados sempre para os lugares mais longe e os empregos menos desejados. Suas (ótimas) músicas não são tocadas por ai, suas roupas não são copiadas, seus bairros não são trendy.
Há um esforço para mostrar que como em todo povo que habita essa terra, entre os rroma há pessoas boas e pessoas ruins. Generalizações estão sempre erradas. E que os rroma merecem o mesmo tratamento que todos os demais romenos, ou seja, merecem ser respeitados. Mas o clima ainda é meio de desconfiança.
Não é para menos. Além de ser difícil se livrar dos pré-conceitos, também é difícil se livrar das desconfianças. Os rroma foram perseguidos e mortos durante a segunda guerra mundial e depois perseguidos e mortos durante o comunismo e depois expulsos das casas que lhe foram destinadas durante o comunismo e pronto, ainda recebem muitos olhares tortos. Acredite, andar por ali é muito fora da rota turística. É uma Bucareste que nem mesmo seus moradores parecem conhecer bem.
Visitamos o mercado de flores dos rroma, um antigo armazém que está sendo restaurado e transformado num lindo espaço para a arte dos rroma, com um restaurante típico, área para shows, exposições e venda de artesanato e terminamos nosso tour pela enorme Calea Rahovei no restaurante Mahala, que pintou em suas paredes uma representação de lendas rroma e romenas e misturou tudo em pratos fantásticos, como já contei nesse post sobre os melhores restaurantes em Bucareste.
O que eu senti falta no tour foi de um …rroma. Pois é, apesar de termos andado pela área deles e alguns até terem sido simpáticos, ninguém quis muito papo, então ficou faltando aquele toque insider. Mas não foi só no tour. Senti falta na cidade, senti falta do seu colorido, da sua música…. Eu adoro várias bandas do estilo “balcã” como são chamadas, e uma das minhas preferidas, a Mahala Rai é de Bucareste. Tentei contato para ver se podia ouvi-los ao vivo, mas necas… ninguém respondeu nem eu achei algum lugar onde pudesse ver algo parecido. Por lá, somente os clássicos do pop mundial mesmo.
Mas o tour vale a pena para quem quer saber mais sobre esse lindo povo, recomendo muito!
Bucareste Fora da Rota Turística: Street Art no Alternative Tour
É bastante curioso que uma boa parte das atrações de Bucareste sejam prédios antigos, do período monárquico que se encerrou em 1947 e até prédios anteriores à tal período. Até os prédios novos são meio misturados com o antigo. Você vai passar bastante tempo navegando pela história, pelo passado, mas e o presente?
O presente você pode conhecer aqui nesse tour, bem fora da rota turística e das principais atrações de Bucareste. Bucareste não é super repleta de street art, não tem muitos murais, mas tem artistas muito interessantes e representações que não são fáceis nem de encontrar, nem de entender sozinho. Garanto que você vai curtir esse passeio e vai se sentir parte da cidade ao conhecer seus detalhes lindos e atuais.
Minha guia, a Carmen, era incrível. Além de muito simpática, ela sabia tudo de arte. Não foi apenas mostrando as coisas. Ela conhecia os artistas, as ideias, as intenções. Contou coisas que nunca saberíamos sem ela e não é para isso que um verdadeiro tour é feito?
Vimos algumas representações de cenas da vida na cidade feitas por mulheres, protestos políticos, pequenas máscaras espalhadas discretamente em lugares que não podem ser facilmente removidos.
Conhecemos uma rua inteira que é um mural renovado anualmente com temas relacionados à cidade e o Pisica Patrata e seus Square Cats (gatos na caixa). O mais legal deles fica no portão do Teatro e Cinema Capitol, mas mais legal ainda que a arte, foi conhecer a história desse lugar, um antigo e gigante cinema e teatro a céu aberto que é o exemplo exato do que é Bucareste. Uma cidade em eterna transformação, sempre dividida entre manter ou destruir o antigo, entre criar o novo e resignificar o que já existe. Você pode saber um pouco mais sobre o movimento de revitalização do espaço aqui.
Um lugar que não é visitado nesse tour mas que você pode visitar depois é a instalação Giants of Pantelimon. O Pantelimon é um bairro um pouco afastada do centro e que é cheio de vida. Nele, alguns artistas resolveram contar a história do bairro de um modo diferente, por meio de pinturas nos telhados que são vistas de cima de uma caixa d’água. Você pode ver como esse lugar é bacana aqui nesse post da Luana, que esteve lá em Bucharest junto comigo.
Uma das coisas mais interessantes que a Carmen nos disse durante o tour foi que o graffiti é visto em Bucareste como uma forma de deixar a cidade como ela foi um dia: cosmopolita e colorida.
Em resumo, o tour é bem legal e bem diferente de tudo o mais que você vai ver Bucareste.
Bucareste Fora da Rota Turística: os Judeus Romenos no Jewish Trail
Esse tour é um dos mais legais de se fazer em Bucareste. Há indícios de que os primeiros judeus chegaram na Romênia no século II, quando da ocupação do território pelos romanos, mas desde então rolaram vários movimentos antissemitas em períodos diferentes, com várias ondas de violência.
Porém, em 1878, quando a Romênia conquistou a sua independência do império otomano foi obrigada pelo império russo a garantir os direitos dos judeus no país. Bucareste se transformou numa cidade cosmopolita e colorida, como eu disse, e a comunidade judaica na cidade e em toda a Romênia era imensa. Na década de 30 a população judaica romena era de cerca de 800 mil e só era menor que a da Polônia e da união Soviética. Como sempre, os judeus estavam intimamente relacionados ao desenvolvimento do país e da vida comercial de Bucareste.
Mas ai, rolou a segunda guerra mundial, a Alemanha invadiu/entrou na Romênia e o preconceito e antissemitismo que já eram presentes foram escancarados, com a expulsão/morte de pelo menos metade dos judeus romenos. E depois, durante o período comunista, praticamente todos os remanescentes emigraram para outros países e depois para Israel. Os que não foram, foram presos ou mortos pelo regime e posteriormente foram “vendidos” pelo governo para Israel. Atualmente vivem na Romênia menos de 5 mil judeus.
Marius, o guia que me levou por esse tour, nem judeu é, mas é fascinado por toda a história e sabe tudo. Ele nos guia pela trilha judaica em Bucareste e na Romênia, explicando fatos históricos, mostrando lugares importantes e, acredite em mim, descortinando lugares bem escondidos relacionados à cultura judaica.
Você vai passar por antigas ruas de comércio, importantes pontos históricos, homenagens, marcos e por lindas sinagogas, das poucas que sobreviveram à demolição maciça que aconteceu durante o comunismo e que foram totalmente cercadas por prédios para que não fossem vistas. Pois é.
Achei super interessante saber que Bucareste tem um teatro iídiche em funcionamento até hoje. Uma cultura que aparentemente nasceu ali, assim como o famoso pastrami de New York, dizem, tem suas raízes nas receitas de um imigrante judeu – já contei essa história nesse post sobre a gastronomia romena.
O tour é bem interessante, não apenas pela história, mas principalmente porque os lugares pelos quais passamos são bem fora da rota turística e não são fáceis de serem visitados por conta, mesmo que você tivesse a localização. Está tudo por trás das cortinas mesmo.
O governo romeno apenas reconheceu o genocídio de judeus e ciganos na segunda guerra em 2009! Foi então construído um memorial ao holocausto, um lugar bem simples, que visitei depois do tour e que achei muito impactante. É apenas uma sala, quadrada, com o nome de alguns dos mortos inscritos na parede. Eu era a única visitante (os romenos não são muito chegados nem respeitosos com seus símbolos, uma coisa assim, meio Brasil). Tive dificuldade para abrir a porta e um guarda veio me ajudar e decidiu entrar comigo para se fazer de “guia”. Ele não falava inglês, mas apontou as inscrições e fez uma careta. Depois ficou apontando ao redor, dando de ombros e sei que ele estava dizendo “é só isso”. Perguntei se podia tirar uma foto e ele fez que sim, mas me olhou como se eu fosse meio pino frouxo. Eu queria dizer que nunca daria de ombros para a sensação de isolamento e prisão que eu tive ali, mas não sabia como. Não importa quem seja, todos merecemos ser livres.
Você esperava que Bucareste tivesse tanta coisa legal para ser vista, dentro e fora da rota turística? Pois é, eu achei curioso que muitos romenos que conheci ficavam insistindo em saber por que eu tinha me interessado em visitar a cidade e insistiam ainda mais em saber por que eu tinha gostado. Eu entendo. A nossa cidade nunca parece tão legal quanto realmente é. Nossa história sempre parece menor que a dos outros, nossas gramas menos verdes, nossas comidas mais sem graça. Só que Bucareste tem muito a oferecer para quem está disposto a vê-la e vivê-la e eu espero que você tenha se inspirado!
Não esqueça de ver também onde ficar em Bucareste, de conhecer os melhores restaurantes e o melhor da vida noturna em Bucareste e de ver as 8 melhores razões para visitar a cidade, caso ainda te faltem motivos!
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Essa viagem foi feita a convite do Experience Bucharest (saiba mais aqui), com apoio da Administrația Monumentelor și Patrimoniului Turistic București (AMPT).
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