Último dia em Cusco e nós com o telefone de um Xamã “ponta firme” no bolso, indicação de quem entende do babado. Decidimos arriscar.
Após um rápido telefonema, marcamos na casa dele por volta das 11hs. Ele nos deu um endereço esquisitíssimo nos arredores de Cusco, no meio do mato. O taxista nos cobrou uma fortuna para nos levar até lá, já deixando aquele gosto ruim na boca.
Pedro, nosso simpático e baixinho xamã, nos esperava na estrada com roupas comuns e um gorrinho típico peruano. Entramos, entre matos e árvores, para o quintal da casa dele: um círculo de pedras com uma espécie de “lareira” redonda no meio.
Confesso que, embora viva em meio à inúmeras crenças, religiões e tipos de esoterismo (e quem não vive?), sou desconfiadíssima e estava me sentindo extremamente desconfortável sem saber em que tínhamos nos metido.
Começamos a papear e ele nos perguntou porque cargas d’água estávamos ali. “Olha, a gente só quer uma forcinha, uma boa energia daqui desse lugar maravilhoso…” A resposta dele foi: pódexá!!! Ou o equivalente em espanhol. Seguido de esfregação de mãos e balançar de cabeça de quem já sabe o que fazer ou como nos enganar. Boca com gosto amargo e agora também travada de expectativa.
Ficamos ali sentados, cada um numa pedra e ele disse: vamos fazer 3 coisas: limpeza, equilíbrio e oferenda. Ou o equivalente em espanhol. Ele nos deu uma pedra e umas plantas para segurar, nos mandou fechar os olhos e pensar nos nossos planos, nas nossas vidas, em que caminho queríamos seguir e o que queríamos deixar para trás e sumiu para dentro da casa.
Enquanto tentava me concentrar, só pensava que aquilo estava parecendo meditação: quanto mais você quer liberar a mente, mais ela trapaceia e te traz uma penca de pensamentos nada a ver. Eu tinha muito no que pensar, estava numa fase que mais parecia um maremoto, mas minha mente acelerada só dizia:
“onde será que estamos?
“onde o baixinho foi?”
“será que ele tá lá dentro rindo dos trouxas, sentados aqui com esses paranuás na mão?”
“será que alguém ta vendo a gente da rua?”
“será que eles se incomodam de estarmos aqui fazendo isso?”
“mas o que é isso mesmo?” e assim por diante…
Resolvi abrir só um olhinho para ver o que acontecia e me deparo com o Gabri concentradíssimo, aparentemente resolvendo todas as suas paradas. Ninguém na rua. Fecho os olhos de novo e faço minha parte. Rápido para não ser atacada novamente pelos pensamentos malucos….
O xamã voltou com mais um monte de paranuá, nos fez enterrar as coisas ruins, nos molhou com umas águas mágicas (who knows?), nos deu uns colarzinhos de proteção e mandou a gente deitar no chão para uma sessão de equilíbrio com pedras energizadas pelo sol.
Pensa numa pessoa tensa! Já eram 12hs, estava um sol de rachar coco e eu nem tinha passado filtro solar! Tragédia anunciada. Eu ainda vestia calça jeans, botas e manga comprida, pois na sombra fazia frio…. Depois de tudo ajeitado, fiquei lá deitada pedindo ao sol para ter pena de mim, à terra para me tirar do maremoto, aos bichos para ficarem onde estivessem e ao ar para mandar um vento e dar um refresco.
Os minutos passando, xamã sentadinho lá numa pedra e eu pensando:
“que estamos fazendo?”
“vou queimar bem na gola em V!”
“como vamos embora?”
“vou mesmo queimar bem no úuuuultimo dia e voltar horrível para SP!”
“quanto saporra vai custar?”
Sim, cometemos esse erro. A conversa engrenou e as coisas aconteceram antes de acertarmos tudo. Sim, amigos, xamã também come, bebe e paga aluguel, né? Os trabalhinhos não são “de grátis”, não. Eu não conseguia ver um bom final para isso tudo. Não tínhamos mais muito dinheiro nesse fim de viagem, ele com certeza não aceitava cartão, não falamos espanhol muito bem e se não pudessemos pagar imaginava todo tipo de tragédia que poderia acontecer.
Entre os momentos de devaneio e aquele em que eu realmente senti a good vibe, o xamã perguntou se a gente queria terminar. Na mesma hora levantei e fui sentar à sombra. Como o Gabri quis continuar, fiquei de papo com o xamã, que disse que tudo aquilo tinha me feito muito bem e que eu ia ficar melhor ainda depois de comer umas folhinhas de coca. Sempre pode ficar mais doido, sempre.
Sem tempo de dizer não, recebi uma mãozada de folhas e comecei a comer. Achei que fosse cuspir, mas o xamã sorridente me mandou engolir. Obedeci para acabar logo com aquilo, torcendo para as folhinhas não me fazerem mal.
Não é ótimo?, ele me pergunta com mais sorrisos e balançar de cabeça enquanto o Gabri se mantém imóvel, aparentemente se equilibrando até a próxima vida. Sim, ótimo, respondo com sorriso amarelo. Então toma mais uma mãozada! Ainda bem que cresci tomando chá de boldo! No fim eu já estava até gostando….
Depois disso preparamos uma mega oferenda linda, toda colorida! Eu queria ter fotografado, mas não quis estragar o momento. Durante os preparativos o xamã pediu para pensarmos em tudo de bom que queríamos atrair na nossa vida e tudo o que gostaríamos de agradecer.
Eu e o Gabri demos aquele olhar de casal quando sabe o que o outro ta pensando e o Gabri contou para o xamã um grande plano nosso. Ai aconteceu daquelas doideras que acontecem quando a gente se mete nessas coisas. O xamã pulou da pedra e achei que ele ia falar que ia vir embora com a gente, de tão feliz que ficou, mas ao invés disso ele nos disse que estava vendo na forma como montamos as oferendas que nossos caminhos estavam abertos e teríamos muito sucesso na nossa empreitada.
No meio da euforia xamânica, eis que um pássaro dá um grito de uma árvore e passa rasante sobre nossas cabeças. Tínhamos passado a semana tentando ver um condor, que dizem que é um ótimo sinal para a vida dos viajantes, e eis que o pássaro surge bem agora!
Tá bom, não era um condor. Talvez fosse até uma pomba. Mas o xamã ficou de pé, riu alto, bateu palmas e disse que aquilo era muito bom sinal e indicava que nossas preces estavam sendo ouvidas.
Eu sei, eu sei, ainda podia ser a maior enganação, mas ai eu já não me importava mais. Fechei os olhos com força, avisei a mente que não tinha mais conversa fiada, agradeci à Deus e todo mundo, ao sol que me torrou, à pomba que abençoou e, principalmente, à todos os obstáculos que eu tinha enfrentado nos últimos tempos porque isso, isso sim, tinha me feito crescer, me deixado mais forte, me levado até ali, onde tudo de lindo estava acontecendo comigo e com meu amor.
Ah é, e visualizei todo nosso sonho se realizando, porque vai.
No fim, não foi barato, mas tudo se resolveu muito tranquilamente. Ainda compramos umas esculturas dele e pagamos mais porque quisemos.
Um par de horas depois, deixamos a casa do xamã pelos fundos, pois ele disse que a volta era só descida e daria para ir a pé. E eis que 2 passos depois descobrimos que o quintal dele era o quintal de Sacsayhuaman!!! Boquiabertos, percebemos que fizemos nosso ritual ali, árvore com árvore do lugar mais incrível e cheio de pedronas energizadas de Cusco (todo esotérico quer fazer isso, mas é proibido fazer rituais e piqueniques lá dentro). Mais um sinal de que às vezes a gente nem precisa saber onde está…
No fim, eu não sei dizer com certeza se foram os rituais do xamã, se foi a energia natural de Machu Picchu ou o quê, mas foi lá que deixei para trás uma atitude super negativa que eu vinha tendo e minha vida mudou desde então. Não, não mudou loucamente, tipo vou para a Oprah contar minha história, mas eu simplesmente resolvi umas questões e fiquei mais feliz.
E por esse pouquinho a mais de felicidade, eu faria tudinho de novo!!!!!! Me xamã que eu vou!
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