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Ilha do Ferro Alagoas – Roteiro de Viagem pelo Artesanato e pelas Águas do Velho Chico

A Ilha do Ferro em Alagoas é um daqueles lugares mágicos que parece apenas uma vila minúscula, mas que logo você descobre que é gigante em tantos aspectos que o espaço físico parece desproporcional. Nosso coração é arrebatado por ele sem que a gente sequer se dê conta. Já comecei emocionada assim, porque é desse jeitinho mesmo, a Ilha do Ferro encanta. Vou tentar explicar aqui o motivo desse cantinho ser tão único, falar sobre o maravilhoso artesanato da Ilha do Ferro e sobre o navegar nas águas do Rio São Francisco num roteiro de viagem para os amantes de calmaria, arte e simpatia.

Encantos da Ilha do Ferro Alagoas!

Os encantos da Ilha do Ferro

De uns tempos para cá a Ilha do Ferro caiu na boca do povo e começou a aparecer aqui, acolá e em todo lugar. Ficou hypada, como dizem atualmente.

Esse interesse todo surgiu da valorização do artesanato produzido pelos Mestres Artesãos que vivem na Ilha do Ferro, um pessoal simples na forma de viver, mas que é superabundante em criatividade, delicadeza e originalidade.

O legado de Seu Fernando Rodrigues

Tudo começou  na década de 80, quando a museóloga Carmen Lúcia Dantas e o fotógrafo Celso Brandão visitaram o povoado para fazer uma pesquisa e fotos sobre o bordado “Boa Noite”, característico da Ilha do Ferro e que seria tratado numa exposição sobre o artesanato alagoano. Eles conheceram Seu Fernando, o primeiro Mestre Artesão da ilha e espalharam a palavra.

O trabalho de Seu Fernando era orgânico no sentido mais puro dessa palavra. Sim, seus bancos, mesas e cadeiras tem como características seguirem as formas naturais da madeira da caatinga, sendo curvilíneas, retorcidas, caídas ou trazidas pelo rio, mas o que quero dizer é que esse trabalho brotou do seu coração, influenciado por nada além da natureza que existia à sua volta e da arte que havia dentro de si.

Seu Fernando era analfabeto e tinha sido sapateiro, mas depois dos 60 anos começou a “tirar as formas presas na madeira”, construindo peças originais e úteis ao mesmo tempo. Suas cadeiras, hoje famosas, são expostas lado a lado com as criações de designers famosos como os irmãos Campana, Zanini de Zanine e Sérgio Rodrigues. Um gigante.

Você talvez esteja se perguntando se esse único homem foi capaz de elevar o pacato povoado a ponto de hoje estarmos despencando até o interior de Alagoas para conhecer a Ilha do Ferro, e a resposta é sim. As pessoas começaram a visitar a Ilha do Ferro para ver o trabalho dele e continuam visitando encantadas o Ateliê Boca do Vento, que após a passagem do Seu Fernando continuou seu legado pelas mãos de seus familiares, como Seu Walmir, sua filha Rejânia e neta Camille.

Mas muito mais do que isso, Seu Fernando inspirou o vilarejo todo e os artistas se multiplicaram de forma espantosa. Atualmente praticamente todas as casas são ao mesmo tempo morada e ateliê e a Ilha do Ferro tem a maior concentração de artistas por metro quadrado do Brasil. Tá, eu não tenho certeza se é a maior concentração do Brasil, mas se não for, será, porque não tem como andar 5 passos sem se deparar com alguém fazendo artesanato. Está por todo lado. Mesmo.

Arte do Mestre Caboco, um dos herdeiros de Seu Fernando da Ilha do Ferro.

Ilha do Ferro – Artesanato e Bordado Boa Noite

O artesanato em madeira é hoje o grande destaque da Ilha do Ferro, reconhecido no Brasil todo e fora dele. O toque genial de Seu Fernando ainda está lá, mas cada Mestre Artesão tem seus próprios talentos e famílias inteiras estão envolvidas nos processos, seja ajudando nas vendas e envios, seja pintando ou acrescentando detalhes.

Uma pessoa me disse com certa mágoa que uns iam apenas copiando os outros. Mas a verdade é que a arte é isso, a inspiração vem, em sua maioria, de replicar o que existe, de entender o que é belo, o que é desejado, assim como o próprio legado do Seu Fernando serve de inspiração para os demais Mestres Artesãos da Ilha do Ferro. Mas eles vão encontrando caminhos, criando formas novas, traços particulares, identidade. Arte é movimento, mudança, evolução através das referências. E tem tudo isso por lá.

Todas as casas estão de portas abertas para os visitantes que queiram conhecer, comprar, papear. Não tem um lugar em que você não seja bem recebido e presenteado com simpatia e conversa boa.

Em grande parte, os Mestres Artesãos usam apenas madeira encontrada caída no mato e reciclada. Restos de barcos, portas e janelas descartadas ganham pinturas e formatos novos e até pequeninos galhos viram delicadas esculturas.

A procura crescente pelo artesanato da Ilha do Ferro também gerou uma demanda que não pode ser atendida apenas de forma orgânica ou por reciclagem e isso tem gerado um certo questionamento sobre sustentabilidade, mas eu honestamente acho que embora essa seja uma preocupação essencial, é também uma questão extremamente complexa que deve ser tratada com cuidado, pois envolve sustento, certa hipocrisia, práticas enraizadas de exploração de artesãos enfim, acho que o apoio ao trabalho maravilhoso dos Mestres Artesãos precisa ser preservado enquanto são encontrados caminhos conscientes.

Bordado Boa Noite da Ilha do Ferro disponível na @cooperativa_artilha.

O bordado Boa Noite em linho é característico da Ilha do Ferro e também continua forte. No Boa Noite o tecido é desfiado para depois serem criadas as formas do bordado com quadrados e lindos vazados. O nome vem de uma flor (conhecida também como Maria Sem Vergonha) que serviu como inspiração para alguns pontos típicos.

Eu sei que lendo assim “boa noite”, “desfiar o tecido” e até o padrão de flor quadradinho podem parecer uma conversa abstrata, mas o que você precisa saber é que é um bordado lindíssimo e que chegando lá as Bordadeiras vão te mostrar e te explicar melhor e tudo fará sentido. É um trabalho artesanal primoroso.

Eu acredito que uma vez que uma pessoa desperta o interesse pelo artesanato brasileiro isso vira meio que um vício. Um bom vício. Primeiro brota uma admiração pela capacidade criativa, depois você começa a reconhecer a assinatura de cada Mestre Artesão, vai entendendo o que você gosta mais e quando vê está numa casa abarrotada de arte e não resiste à novas aquisições. Aqui é assim pelo menos. Rá-Rá.

E falo a-r-t-e e escrevo sempre assim, Mestres Artesãos e Bordadeiras em maiúsculo porque gente do céu, o artesanato é uma das manifestações artísticas mais fodas que temos nesse país e é com todo esse orgulho, respeito e elevação que temos que tratá-lo. Quem reduz esses trabalhos à uma arte menor é um babaca.

Vá. Compre. Ilumine sua casa, sua vida. Valorize os Mestres e Bordadeiras.

Arquitetura na Ilha do Ferro

Para completar, parece que desde a colonização o povo da Ilha do Ferro optou pela beleza em seu dia a dia e a maioria das casas da vila tem platibandas na fachada, deixando o lugar ainda mais pitoresco, fotogênico e fofo.

Platibandas, se você não sabe, é como uma fachada quadradinha que esconde o telhado. No topo, detalhes podem ser esculpidos ou pintados. Você vai ver uma monte de fotos nesse post, porque é irresistível fotografá-las.

Mesmo as casas recém construídas seguem o padrão das platibandas e a simplicidade das residências. Ainda que as casas para aluguel para turistas tenham adotado comodidades modernas como ar condicionado, a essência é a mesma. Não tem como não se apaixonar.

Casinhas da Ilha do Ferro.

Casinhas da Ilha do Ferro.

Roteiro Ilha do Ferro.

Simpatia é quase amor

Acho que já deu para perceber que os encantos da Ilha do Ferro estão quase todos ligados às pessoas, afinal sem elas não tinha artesanato, bordado e nem casas lindinhas pintadas como se todas as cores do mundo precisassem ser usadas.

Sempre que você ouvir falar da Ilha do Ferro você vai ouvir do povo. De como as pessoas são carinhosas, acolhedoras, conversadoras, simpáticas. E simpatia é quase amor, né?

Andando pelas ruas todo mundo se cumprimenta, um simples bom dia é respondido com um desejo para que nosso dia seja maravilhoso, ou que nossa noite seja tranquila e cheia de bons sonhos. As pessoas param para ver suas fotos, a cada casa visitada você vai conhecendo pessoas, enquanto os Mestres Artesãos mostram seus trabalhos, surgem mães orgulhosas ou esposas ou filhos e puxam uma cadeira para te conhecer e papear. Sem perceber você já sabe quem está para ter bebê, que Dona Morena está no hospital, que tem um sorvete de umbu artesanal por ali, que a Cabra é uma casa destinada à residências artísticas e que não sei quem passou nove meses lá… e assim vai.

Sabe aquele orgulho de ser brasileiro que anda meio esquecido? Aqui ele é resgatado com gosto e ressoa.

Visitamos uma bordadeira nos arredores e compramos uma lembrança para botarmos na parede. Quando nos despedimos o filho dela nos disse “foi uma honra conhecer vocês” e a gente quase chorou porque embora talvez a palavra usada tenha sido meio exagerada para o momento, nós entendemos o carinho com a nossa presença. Todo artista quer e merece ser visto e respeitado. E foi uma boa palavra para ser trazida para a minha mente porque é isso que acredito que nós devemos fazer: honrar o talento do nosso povo.

Eu ainda deixo aqui uma reflexão que fiz várias vezes enquanto caminhava por lá: sempre ao caminhar pela cidade eu via pessoas praticando suas artes. De dia, o pessoal estava sempre esculpindo ou pintando. À noitinha, as mulheres estavam sempre nas ruas bordando em rodas. Isso significa pouca tela, pouco estímulo mental baseado em algoritmos e em produção massiva de conteúdo.

Não estou dizendo que as pessoas não viam TV ou não estavam com celulares, mas era realmente diferente da dinâmica em que vivemos e que deixa muita gente ansiosa, polarizada e maluca. Talvez por isso sobre tanto espaço para a simpatia e para a beleza.

Pensei muito na minha avó, que crochetava sempre, mesmo diante da TV. Acho que aquilo a libertava, a relaxava, enquanto ficava focada na sua arte. Claro que ela tinha preocupações e problemas, mas aquilo ali era um escape, um remedinho diário sem contra indicações. E minha vó era pura simpatia. Acho que seria uma boa moradora da Ilha do Ferro.

Talvez a gente deva se inspirar mais nesse modo de viver.

As pessoas são o maior tesouro da Ilha do Ferro.

Velho Chico e o Sertão

Completando a lista de encantos da Ilha do Ferro, está ele, o lendário Rio São Francisco, o único rio totalmente brasileiro, que nasce e deságua nas nossas terras, correndo da nascente na Serra da Canastra em Minas Gerais, atravessando a Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas até cair no Oceano Atlântico. É o rio do Sertão, contado e cantado em centenas de livros e canções. Sabe? É muita coisa.

Pois bem, a Ilha do Ferro, que não é uma ilha e sim um povoado ribeirinho, fica ali na beira do Velho Chico. Suas águas podem ser turvas ou cristalinas, tranquilas ou violentas, mas estão ali marcando a paisagem e a vida do povoado. Da manhã ao fim do dia os barquinhos vem e vão e nas suas margens a paisagem fica mais verde. É lindo.

Quem não se emocionar ao colocar os pezinhos no Velho Chico é louco.

Não se engane pelas árvores e plantas, basta um olhar mais próximo para ver que a vegetação é da caatinga e saindo da beira do rio a paisagem vai ficando árida e mais escassa. Viver o sertão é passar calor, ver muita terra seca e plantas guerreiras.

Mas o rio, o rio é hipnótico e você pode gastar a vida vendo ele passar.

O que fazer na Ilha do Ferro: nadar no Velho Chico!

Curralinho – Alagoas.

O que fazer na Ilha do Ferro

Bem, agora que você já tem uma ideia dos seus encantos, que recapitulando, são: arte, arquitetura, pessoas e paisagem, vou te ajudar a pensar num roteiro para uma viagem para a Ilha do Ferro.

Não tem segredo sobre o que fazer na Ilha do Ferro: visitar os Mestres Artesãos e Bordadeiras, passear pela meia dúzia de ruas e ver suas casinhas com platibandas, conversar com todo mundo, nadar na prainha do Velho Chico e se quiser acrescentar um extra, fazer um passeio de barco pelo rio.

Mas vou te dar um pouquinho mais de detalhes para você se organizar melhor.

1) Visitar o Museu

Sim, existe um mini museu do Artesanato da Ilha do Ferro. É uma casinha verde ao lado da casa da bonequeira, parteira e benzedeira Dona Morena Teixeira (a que tem uma linda inscrição dizendo “pau que rama flor que cheira”). A porta fica meio encostada, mas fica aberto das 8h às 17h.

O museu é pequenito, mas conta a vida de Seu Fernando e tem exemplares de praticamente todos os Mestres Artesãos, um mapa dos ateliês e exemplos dos tipos de bordado Boa Noite. É um resumo perfeito do trabalho executado na Ilha do Ferro.

Sempre vai ter alguém pra te receber, papear e dar explicações.

Se Dona Morena (@morenateixeira_ilhaa) estiver em casa e disponível, você também pode ver suas bonecas e ouvir as histórias de seus quase 100 anos de vida.

Na casa ao lado do museu Dona Vana vende seu famoso licor de tamarindo, uma iguaria que os alagoanos não deixam de levar para casa. Aproveite para provar e levar sua garrafinha também.

Museu da Ilha do Ferro Alagoas.

Casa da bonequeira Morena Teixeira na Ilha do Ferro.

2) Visitar os Mestres Artesãos e Bordadeiras

Não se preocupe que você não vai ter nenhuma dificuldade em achar os ateliês. Apenas não se acanhe e vá chegando nas casas que você vai ver as portas se abrindo e a arte brotando.

Quando eu disse que quase todas as casas são ateliês eu não estava mentindo, e além dos Mestres Artesãos mais conhecidos, praticamente toda sala tem uma prateleira com criações de seus moradores, todos felizes em te apresentar os trabalhos. Vou deixar os @ do Instagram também, porque eles enviam para todo o Brasil.

Uma parada no Boca do Vento (@atelie_boca_do_vento), logo na entrada da cidade, é obrigatória para ver tanto o legado do Seu Fernando quanto os trabalhos novos que seus herdeiros estão fazendo. As lindíssimas cadeiras continuam sendo produzidas pelos Mestres Walmir, Lucas e Camille, mas toda a família produz totems e outras esculturas, além de máscaras e bordados.

Um pouco acima fica o Mestre Vieira, que tem esculturas super diferentonas, como os homens-pássaros. Mais para baixo ficam os irmãos Salvinho e Cícero (@recanto_salvinho e @ciceroilhadoferro) com diversas esculturas, totems, bancos e cadeiras pintados lindamente.

O Mestre Salvinho tem um peixe preto como uma de suas obras marcantes e eu queria trazer um pra mim. Ele não tinha nenhum pronto, mas se prontificou a fazer um pro dia seguinte.

Eu acho bonito a forma como ele assina seu nome no corpo do peixe. É algo simples, mas singular. Quando fui buscar, ele tinha assinado apenas na borda. Eu não ia falar nada, porque o artista é que sabe, né? Mas o Gabriel comentou que eu gostava e na hora o Salvinho falou, eu faço agora!

Ele não apenas pegou a tinta e pincel para assinar, como buscou cadeira e ventilador para esperarmos, sua esposa veio fazer companhia, explicaram como colocar o gancho pra prender, todo mundo palpitou como que a gente levava embora para não borrar, enfim, tão fofos que os trouxe no coração junto com o peixe.

Mestre Salvinho assinando meu peixe. 💛

Já na rua paralela ao rio ficam os Ateliês do Mestre Vavan (@artista_vavan), cujas esculturas, bancos e cadeironas super coloridas e originais são imperdíveis e cuja esposa, Dona Cláudia, também tem lindos bordados; do Mestre Petrônio (@petronio_artesao) e seu filho Yang (@atelieyangdapaz), que “tiram” de troncos e galhinhos esculturas singulares, dos Farias, também em galhos e troncos, mas com uma pegada diferente e meio alienígena e do o Mestre Dedé (@dedefontestorres), que é outra pessoa simpaticíssima que tem várias peças lindas feitas com pedaços de barcos e galhos.

Ateliê das obras originalíssimas do Mestre Artesão Vavan da Ilha do Ferro.

Lá no Dedé você também encontra peças de outros artistas de outras cidades e vilas, como Seu Beto de Meirus (@betodemeirus), que imortalizou a estrelinha em seus bancos e cadeiras de couro e cuja oficina fica em Pão de Açúcar. Quem vai de carro pode visitá-lo ao passar por Pão de Açúcar, mas se te faltar tempo ou você chegar de barco, aproveite no Dedé. Eu fui até a oficina do “escravo do amor” para comprar um espelhinho e acabei dando até entrevista sobre como conheci o trabalho dele!

No beco que sobe logo depois do Dedé estão Mestre Zé Crente (@zecrenteartesao_), outro queridíssimo, que esculpe umas lindas cabeças de bichos, além de bancos e outros animais que são lindamente pintados por sua esposa e filha, do Mestre Caboco (cabocoilhadoferroal), que tem as gaiolinhas que eu também acho lindas e no fim do beco, fica a casa do filho de seu Dedé, com seus peixinhos.

Já Mestre Aberaldo (@aberaldoilhadoferro), que tem umas esculturas lindas nuns troncões fica ali coladinho na pousada da Vana, próximo do Mestre Genauro e suas arvorezinhas (@genauro_mello) e do Mestre Jailton e sua profusão de cores (@jailton_e_jamille_artepopular).

Existem muitos outros como Mestres Bedeu, Faguinho, Eraldo, Marcos entre outros, além de uma cooperativa e um centro dos artesãos. As bordadeiras são menos identificadas individualmente e muitas vezes vendem também bordados de outras mulheres e até de outros estilos e lugares, mas você não terá dificuldade nenhuma em encontrá-las, até porque estão também em praticamente todos os ateliês-casas.  De novo, apenas siga caminhando e você vai encontrá-los todos.

Você precisa visitar todo mundo? Como posso saber? Você é livre para ver e fazer o que quiser. Se tiver apenas um dia na Ilha do Ferro será inclusive impossível conhecer toda a vastidão artística que existe lá, até porque ainda que pareça tudo madeira, não é nada igual. Só te garanto que você não vai se arrepender de conhecer nenhum deles.

Arte de Clemilton (porta e quadro) e seu Beto de Meirus (espelhinho) na casa Olivia.

Além de Seu Beto de Meirus que citei acima, outros 3 Mestres Artesãos tem seus ateliês nas proximidades da Ilha do Ferro, mas não na vila.

São os jovens irmãos Clemilton (@clemiltonarte) e Amilton (@amilton_793) que junto com sua mãe pintam portas, janelas e pedaços de madeira descartados, o primeiro sempre com desenhos de frente, o segundo com desenhos laterais e a mãe vem com as florzinhas.

A terceira é a Dona Rochinha, que aos 64 anos começou a pintar quadrinhos únicos cheios de humor que hoje estão expostos mundo afora. Os irmãos estão no povoado de Mata da Onça e Dona Roxinha (@roxinhalisboa) fica em Lagoa da Pedra, outro distrito de Pão de Açúcar. Todos tem trabalhos incríveis que valem a sua visita!

3) Nadar no Velho Chico

Naquele calorão, nada como se refrescar no Velho Chico. Porém, o rio é misterioso e não dá para sair nadando aonde dá na telha.

Além de correnteza e pedras, o rio tem piranhas e suas primas pirambembas, que também gostam de uma carninha. Sim, é perigoso e você deve seguir à risca as orientações dos locais e não se aventurar sem perguntar antes. Um pouquinho de observação também ajuda. Você dificilmente vai ver os locais pulando no rio em locais aleatórios e certamente não vai vê-los ali perto do campinho como se fosse uma praia, então se atente aos sinais.

Ali perto do campinho, além das águas serem mais turvas, é onde os barcos ficam atracados e muitas vezes restos de peixe são jogados por ali, o que atrai as piranhas e pirambembas, por isso este não é o melhor lugar para nadar. Inclusive vimos logo no primeiro dia um cara que tomou uma mordida no pé ali e ficamos beeeeem espertos.

Os locais nos deram as seguintes dicas: esses peixes aparecem mais no entardecer, depois das 16h30 e de noite, e preferem as partes do rio onde tem mais “laminha”, evitando os trechos que são de areia. Ficamos atentos com isso.

Para nossa sorte, a Ilha do Ferro tem uma prainha que fica bem pra esquerda do campinho de futebol. Ali tem areia, sombra e é um trecho um pouco protegido da correnteza e com águas cristalinas, perfeito para um banho bem preguiçoso.

Outro ponto adequado para banho é a Ilha dos Anjos, que fica em frente à Ilha do Ferro. A prainha que se forma ali é realmente deliciosa e você vai parar lá se fizer um passeio de barco ou pode simplesmente pedir para um barqueiro te levar e buscar numa hora marcada (em geral cobram cerca de R$ 50,00 para isso). Não tem nada na Ilha dos Anjos, então leve comida e água e não se assuste (muito) com o cemitério dos anjos, crianças que foram enterradas ali.

O que fazer na Ilha do Ferro: nadar no Velho Chico!

4) Passeio de barco partindo da Ilha do Ferro

Da Ilha do Ferro você pode fazer 2 passeios de barco.

O mais comum faz paradas para banho no Velho Chico, tanto na Ilha dos Anjos como no meião do Rio, numa área deliciosa que os barqueiros conhecem, depois visita o povoado de Mata da Onça para conhecermos o ateliê de Amilton e Clemilton e as bordadeiras locais e faz mais uma parada no bucólico povoado de Curralinho para almoço.

O passeio em si é bem simples, mas é bem gostoso. Navegar no rio é uma delícia, uma sensação que você vai entender lá. Os banhos são perfeitos e a comida em Curralinho é gostosa e com preço bem justo. Você toma sua cervejinha gelada enquanto vê a vida girando por ali, os cavalos passando, os barquinhos zarpando, enfim, uma paz imensa. As voadeiras costumam custar a partir de R$ 300,00 até 3 pessoas e mais R$ 100,00 a cada pessoa extra.

A outra opção de passeio é ir até Piranhas e Entremontes. Esse trajeto é mais longo, pois passa Mata da Onça e Curralinho e segue mais uma meia hora de navegação. As paradas você vai combinar conforme seu interesse. O povoado de Entremontes tem uma praia deliciosa e muito bordado, dá para parar em Angico para conhecer a Rota do Cangaço (mas esse seria idealmente um passeio de dia inteiro) e Piranhas tem um centro histórico bem bonitinho. Aqui os preços partem de R$ 500,00, a depender das condições. Eu particulamente acho que vale a pena dedicar uns dias para conhecer Piranhas mais calmamente.

Você pode entrar em contato com os barqueiros Dedé (79 999623252) ou Junior (79 998535467) para agendar, ambos gente boníssima e muito conhecedores do rio.

Em agosto acontece um evento único da Ilha do Ferro: a corrida de canoas, em que seguem com velas rio abaixo. Parece lindo.

O que fazer na Ilha do Ferro: nadar no Velho Chico!

Fim de tarde no Rio São Francisco.

5) Desacelerar

Bem, apesar de não ser uma “atração” da Ilha do Ferro, desacelerar é atividade mandatória por lá. Não tem como correr com nada, não tem para quê correr com algo.

O calorão te obriga a ir mais devagar, a esperá-lo melhorar numa rede com vento na cara, a observar o rio passando. Ninguém tem medo, nem vive em alerta. Não tem restaurantes (um ou outro lugar serve comida às vezes) para você conhecer. Assim que o sol baixa, todos saem com suas cadeiras para a rua e ficam conversando e bordando sob o luar. O ritmo da vila é outro, tudo vai mais devagar, mais desconectado. APROVEITE.

A paz da Ilha do Ferro!

Roteiro para uma viagem para a Ilha do Ferro

Agora que você já tem todas as informações possíveis, te dou opções de roteiro para uma viagem para a Ilha do Ferro.

Bate e volta de Piranhas – AL

Considerando tudo o que falei, parece fácil conhecer tudo em 1 único dia e muita gente faz até um passeio “bate e volta” vindo de Piranhas. É válido, principalmente se você preferir ficar num lugar um pouco maior e mais estruturado e se você ainda não for um viciado, ou melhor dizendo, se o seu interesse pelo artesanato da Ilha do Ferro for mediano e apenas dar uma voltinha geral já te satisfaça.

Se este for seu caso, fique em Piranhas (falo de lá em outro post) e evite fazer o trajeto de carro, pois são 2hs de viagem em cada sentido e será bem cansativo. Faça um passeio de barco de Piranhas até a Ilha do Ferro. A viagem de barco vai demorar cerca de 50 minutos, e pode ter paradas para banho ou em outro vilarejo no caminho, assim como o passeio em sentido contrário que mencionei.

Mas eu sugiro de coração que você pernoite na Ilha do Ferro e passe pelo menos 2 dias inteiros por lá.

Primeiro porque é muito calor e entre 10h e 15h é difícil andar sob sol escaldante. Ao fazer um bate e volta, você vai precisar suar muito para visitar os Mestres Artesãos ou vai desistir no caminho. Além disso, como eu já te avisei ai acima, todo mundo lá é bom de papo, então qualquer parada pode facilmente se transformar em mais de hora de conversa e você vai sentir que o tempo foi pouco. E terceiro porque o próprio conceito de tempo na Ilha do Ferro é outro e você só vai entrar na ritmo local ficando por lá.

Detalhes – Ilha do Ferro Alagoas.

Roteiro de 2 dias na Ilha do Ferro

Tendo 2 dias inteiros na Ilha do Ferro você vai conseguir visitar os ateliês com calma, parando no meio do dia para um banho de rio ou um cochilo, pode fazer eventualmente uma encomenda e vai ter tempo para caminhar e tomar uma cervejinha gelada olhando pro Velho Chico.

Em 2 dias você pode simplesmente dedicar todo seu tempo às visitas e banho na prainha ou pode no dia 2 fazer um passeio de barco. Tendo uma noite livre você pode conhecer o Bar Macumba, um lugar com decoração única e boa música coordenado pelo simpaticíssimo artista e agitador cultural André Dantas. Se der sorte, pode até pegar uma das animadas “Noites de Salão”.

Roteiro de 3 dias ou 4 dias na Ilha do Ferro

Para quem não quer se esticar muito, mas também quer sentir mais o que é a Ilha do Ferro, considero que 3 dias é o período ideal.

Nesse tempo você vai fazer as visitas com calma, vai na praia com calma, pode fazer um ou mais passeios de barco.  Pode ir no Bar Macumba e voltar para papear com seus novos amigos. Vai poder dormir cedo ou dormir tarde, pode descansar a tarde toda na sua rede, enfim, você vai respirar e não apenas passar por tudo num borrão.

Se tiver 4 dias, melhor. Mas se você quiser ser feliz de verdade, fique mais.

Curta a Ilha do Ferro devagarinho.

Mais e mais dias na Ilha do Ferro

Passei 6 dias na Ilha do Ferro e se pudesse, teria ficado mais.

Tive tempo de descansar de verdade. Vi o nascer do sol e da lua sobre o Velho Chico, balancei dias inteiros na rede de frente pro rio sem me preocupar em sair e conhecer nada. Tomei banhos e mais banhos de chuveirão e de rio. Acordei com 20 galos e galinhas na minha porta. Fiz amizade com os cachorros. Saí cedinho para fotografar. Fui tomar sorvete de umbu no Cantinho da Ilha vendo o pôr-do-sol. Fui e voltei no Salvinho para buscar meu peixe. Visitei os Mestres Artesãos sem pressa nem compromisso. Fui no Macumba, vi futebol no campinho, ouvi música romântica no Botafogo. Passei mal.

Se dê tempo, se dê espaço para conhecer a Ilha do Ferro com um pouquinho mais que os olhos, mas também com o coração. Você será arrebatado. Palavra.

Roteiro Ilha do Ferro + Piranhas

Um roteiro bacana para uma viagem pelo sertão é combinar a visita à Ilha do Ferro com uma visita à Piranhas para conhecer a cidade histórica, Angicos e os Canyons do Xingó. Quatro dias em cada cidade é o suficiente, mas um pouco mais corrido. Se puder ficar mais, fique, tanto em uma quanto em outra.

Para quem vai voar, dá para combinar esse roteiro com alguns dias em Aracaju (que foi o que eu fiz e adorei) ou com Maceió e praias de litoral, caso em que sugiro ter mais uns dias.

Ilha do Ferro: Uma saudade!

Onde Ficar e Onde Comer na Ilha do Ferro

A Ilha do Ferro tem apenas uma pousada, digamos assim, oficial. É a Pousada da Vana (79 9968284438), que é uma gracinha e que também é um dos poucos lugares que servem refeições, desde que você agende antes.

O Tubarana é o hostel da Ilha do Ferro. Outro lugar muito bonitinho, do mesmo dono e em frente ao Bar Macumba.

Hostel Tubarana, Casa Cabra e Bar Macumba: tudo nascido bonito.

Além dessas opções, há algumas casas para aluguel pelo Booking ou Airbnb, como a  Casa Frei, a Casa Sibite, a Casa Beija-Flor e a Casa Cacto. Essas casas são, se não todas, em sua maioria, de pessoas de fora da Ilha do Ferro, mas que tem muito carinho pela vila e que criaram espaços aconchegantes e repletos de artesanato da Ilha do Ferro. São quase galerias. E tem cozinha, um item importante pra quem vai ficar mais dias, já que não tem restaurantes.

Eu me hospedei na Casa Olivia e acho que ajudou a tornar minha viagem tão maravilhosa. A casa é básica, mas confortável em tudo e com uma vista deslumbrante do rio e muito vento, já que fica bem ali na “boca do vento”. Todos os dias, quando eu saía do quarto e me deparava com aquela vista eu ficava sem ar. Não me acostumei, sentia sempre uma alegria imensa.

Ainda tinha peças de todos os artistas da Ilha do Ferro, incluindo lindas portas pintadas por Clemilton, uma seleção perfeita de vinis e para meu desbunde total e absoluto, uma ótima seleção de livros sobre arte e artesanato regional, cangaço e clássicos da literatura brasileira. Se eu pudesse, morava lá nessa casa.

Além das casinhas, muitos moradores tem opções para dormir, todos muito ajeitadinhos para turistas, com ar condicionado e tudo. Eles não estão tão divulgados e tem gente que acha que não tem mais onde ficar na Ilha do Ferro, mas tem sim e ao se hospedar com eles você está contribuindo ainda mais para a economia local. O Dedé (Mestre Artesão e Barqueiro – 79 999623252)  tem uma pequena pousadinha e o Ateliê Boca do Vento (79 996429882) tem um chalé.

Casa Olivia, um pequeno paraíso na Ilha do Ferro.

Casa Olivia, linda do amanhecer ao anoitecer.

Eu com Velho Chico, Lampião, Maria Bonita, Gal e Vavan. 💛

Já para comer não é tão simples. Somente a Pousada da Vana e o bar Botafogo estão mais constantemente abertos e servem refeições, mas em qualquer caso é bom dar uma conferida ou agendar antes. A sorveteria Cantinho da Ilha, no canto direito, é bem gostosa e sempre tem alguém para atender.

De noite, vá ao Bar Macumba (o do orelhão da Saudade), mas na praça tem uns quiosques com cerveja.

Para quem fica mais dias, será importante estar numa casa com cozinha. A vila tem um mercadinho com artigos essenciais, mas a depender do que quiser comer, terá que trazer das cidades maiores.

Como chegar na Ilha do Ferro

A Ilha do Ferro que, como eu disse, não é uma ilha e sim um povoado de Pão de Açúcar, é acessível de carro. Não tem ônibus para lá e sem carro a visita é complexa, pois dependeria de táxis ou caronas e não recomendo.

Os aeroportos mais próximos são os de Maceió e Aracaju e ficam a praticamente a mesma distância. De qualquer um deles serão umas 4hs de viagem.

Quem vem de Aracaju precisa atravessar a balsa de Niterói para Pão de Açúcar (sim, são esses nomes mesmo) e de lá seguir uns 20kms em estrada de terra para a Ilha do Ferro. A balsa é 24h e custa cerca de R$ 10,00, que devem ser pagos em dinheiro. A Ilha não tem banco nem maquininhas, tudo é pago com dinheiro ou pix, esteja preparado!

Para quem vem ou vai para Piranhas, o melhor caminho é via Pão de Açúcar. Embora seja um trajeto alguns quilômetros mais longo, no fim das contas dá o mesmo tempo que o caminho direto via Caboclo, porque a estrada está ruim e pode inclusive ser de difícil acesso para carros comuns.

É isso. Você já sabe tudo para organizar sua viagem para a Ilha do Ferro! E lembre: honre o trabalho dos Mestres Artesãos e Bordadeiras. É nosso, é lindo, é valioso.

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