A fotografia oculta de Vivian Maier é uma das coisas mais instigantes para qualquer amante de artes. Você já ouviu falar? Pois é. A busca pelas fotos dela se intensificaram demais depois do lançamento do documentário “Finding Vivian Maier“, que conta essa história cheia de mistérios. As imagens, compostas principalmente de personagens captados em fotografia de rua e fotografia de viagem, são estarrecedoras. Vem saber mais!
PS: quase morri para separar poucas (ou não tão poucas assim) fotos dela para ilustrar esse post. A fonte de todas é o acervo do www.vivianmaier.com. Depois procure por mais, é tudo fantástico!
A Fotografia Oculta de Vivian Maier e a Revelação ao Mundo
Começando pelo princípio. Vivian Maier não foi uma fotógrafa profissional em vida. Foi uma babá e morreu sem que sua brilhante fotografia de rua e de viagem fosse conhecida pelo mundo.
Em outras palavras, sua arte foi apenas SUA enquanto viveu e por isso se fala em “fotografia oculta de Vivian Maier”.
Foi em 2008 que John Maloof, após comprar uma casa no Northwest Side de Chicago, decidiu escrever um livro sobre este bairro meio desconhecido (na época), mas cheio de história.
Ele começou a procurar fotos do bairro e dos moradores que pudessem ilustrar esse livro e acabou numa casa de leilões em que se compra caixas fechadas abandonadas em depósitos, no estilo daqueles programas do History Channel, sabe? Ele vislumbrou uma caixa com alguns negativos e comprou, mesmo sem saber direito do que se tratava.
Ao analisar as fotos (que não eram da área que procurava) ele se encantou com o estilo da fotógrafa, que descobriu terem sido tiradas por Vivian Maier, que tinha alugado alguns depósitos para guardar suas coisas quando foi viver numa casa de repouso, até sua morte naquele ano.
Intrigado, Maloof foi atrás das demais caixas e conseguiu recuperar milhares de fotos e negativos que estavam prestes a ir para o lixo!
Conforme revelava os negativos, ele iniciou um blog no Flickr para mostrar as fotos de Vivian Maier para o mundo e trocar ideias sobre elas.
A cada dia crescia o número de pessoas encantadas tanto pelo trabalho quanto pelo mistério que era a história da fotógrafa. No melhor estilo Globo Repórter começou uma verdadeira investigação para saber quem era Vivian Maier, onde vivia, o que fazia, do que se alimentava. E quanto mais informações encontravam, mais mistério surgia!
Em 2014 John Maloof e Marvin Heiferman editaram um livro com algumas das fotos encontradas chamado “Vivian Maier: A Photografer Found” e posteriormente foi lançado o filme “Finding Vivian Maier” ou “A fotografia oculta de Vivian Maier”, além de outros livros que só aumentavam a cada dia o interesse e o amor pelo trabalho dela.
E por essas e por outras hoje Vivian Maier é um nome que figura entre os mestres da fotografia, mesmo que em vida ela nunca tenha se revelado ao mundo.
Vivian Maier – Fotos de Rolleiflex
Uma das principais curiosidades sobre as fotos de Vivian Maier é que ela usava uma câmera Rolleiflex, a queridinha de muitos fotógrafos do mundo todo que consideram seu uso um estilo de vida.
Essa câmera, criada nos idos dos anos 20 é até hoje utilizada em estúdios e por muitos fotógrafos profissionais. Seus negativos geram fotos de 6×6, que a caracterizam.
Mas o que apaixona os fotógrafos é a lente dupla ou reflex. A câmera tem um formato retangular em que a imagem é captada por uma lente na parte da frente e de baixo e reflete na lente de cima. Com isso, o fotógrafo não precisa ficar com a câmera no olho, pode mantê-la apenas na frente do corpo, em qualquer altura.
Essa característica, dizem, facilita a vida de quem faz fotografia de rua, como é o caso da Vivian Maier, porque possibilita uma aproximação do objeto ou pessoa fotografada sem parecer uma invasão. Além de permitir que a pessoa veja o rosto do fotógrafo, que pode sorrir ou conversar (o que convenhamos, sempre cai bem), não parece que o fotógrafo está grudado, invadindo.
Ao que parece, Vivian explorava muito bem essas características da sua Rolleiflex. Ao procurar informações sobre a vida da fotógrafa, Maloof descobriu que, além de não ser profissional, ela sempre viveu sozinha e ninguém soube informar quem eram sua família ou amigos.
Sabiam apenas que ela andava sempre com sua câmera em passeios por Chicago e que ninguém via suas fotos. Muita gente achava até que ela só usava a câmera pendurada na frente do corpo para fazer tipo!
Há muitas teorias sobre esses mistérios, e a que se mostra mais provável é que Vivian fosse muito tímida e instrospectiva, ou seja, uma boa observadora. E que o formato da câmera a ajudava a se aproximar de desconhecidos para fazer suas lindas fotografias de rua num incrível paradoxo entre sua natureza antissocial e sua capacidade de se conectar com desconhecidos.
O que sabemos com certeza é que Vivian amava fotografar. E é o que importa.
Finding Vivian Maier
Com toda a pesquisa feita por Maloof e pelos interessados na fotografia oculta de Vivian Maier, em 2013 foi lançado o documentário Findig Vivian Maier contando a história da localização do acervo e da pesquisa para desvendar quem era a talentosa fotógrafa.
Pela qualidade das imagens e pelo olhar aguçado de Vivian, havia aqueles que esperavam descobrir que ela era famosa e usasse um pseudônimo, ou que tivesse feito parte de um grupo de fotógrafos profissionais ou até que tivesse algum relacionamento com algum fotógrafo (a) conhecido.
Não que desmerecessem o talento natural que ela aparentava ter, mas no meio profissional, é comum que os talentos se desenvolvam com os toques e ensinamentos compartilhados entre fotógrafos, então parecia possível que Vivian estivesse envolvida em algo assim.
Mas ao invés de trazer respostas claras, Finding Vivian Maier traz ainda mais especulações sobre a vida misteriosa da fotógrafa.
Sem dar spoilers, o documentário mostra que as famílias para as quais trabalhou a viam de forma diversa. Não apenas tinham impressões variadas, mas também afirmavam que ela tinha diferentes sotaques e que viveu em países aleatórios.
O que todos concordam é que ela era ótima com as crianças e que nunca permitiam que entrassem no seu quarto onde o banheiro era transformado em câmara escura para revelar as fotos.
Tem como não amar essa personagem que parece saído de um livro?
O documentário Finding Vivian Maier é super interessante e está disponível na Netflix e acho que até no Youtube. Corre pra ver!
Fotografia de rua e de viagem
Mas voltando às fotos de Vivian Maier, a grande maioria das imagens foi feita em preto e branco e consiste em fotografia de rua e de viagem.
Bom, falo mais da fotografia de viagem da Vivian abaixo, mas acho que o simples fato das fotos serem na maior parte em Chicago, uma das cidades mais fotogênicas e interessantes dos Estados Unidos na minha opinião, já poderia caracterizar essas imagens de fotografia de rua E de viagem.
Nas centenas de imagens que ela fez em suas andanças (ou seriam viagens?) pela cidade, Vivian retratou milhares de pessoas e situações e essa fotografia de rua parece um verdadeiro registro histórico das transformações de Chicago e seus moradores.
De simples transeuntes à artistas em frente à teatros, de pessoas comuns em situações corriqueiras à cenas policiais, não tem nem como descrever a riqueza das fotos dela.
A sensação que dá ao manusear os livros que Maloof editou ou simplesmente ver as fotos na internet é a de que em algum momento alguém vai sair das imagens e começar a contar uma história. Estão ali Chicago e seu povo em sobretudos e penteados pomposos que vão se transformando nos anos 70 e 80 e chegando num mundo novo.
O olhar dessa mulher era extremamente apurado. Lembrando que isso tudo é pré era digital, né? Não dava para fazer mil fotos e “escolher a que ficou boa”. Ter uma imensa quantidade de fotografia de rua de alta qualidade é simplesmente impressionante.
Já falei um pouco sobre “a sorte do olhar” nesse post sobre Steve McCurry, leia também.
As imagens são hipnotizantes. Há figuras engraçadas, altivas, derrotadas, doentes, frágeis, carinhosas e sempre, sempre um lindo enquadramento.
Há também uma parte de fotos coloridas. Fica claro que Vivian preferia o preto e branco, mas quando vemos as fotos em cor também fica claro que o olhar da bicha era mesmo de uma delicadeza ímpar e que ela sabia como ninguém o poder de cada elemento da fotografia.
Para completar, Vivian Maier soube bem aproveitar suas saídas para fotografia de rua para fazer auto retratos incríveis.
Utilizando vitrines, espelhos e reflexos diversos, Vivian mostrou sua carinha para nós e também a verdade de que para quem tem talento, nunca foi necessário uma câmera frontal.
Acho que mesmo que ela tivesse um celular hoje, suas fotos não seriam da obviedade das nossas selfies e trariam elementos de composição que ela sabia tão bem como manejar.
Sem falar que ver esse rosto sempre sério aguça ainda mais nossa curiosidade, né? Quem era ela? Podemos ser amigas?
Fotografia de Viagem da volta ao mundo de Vivian Maier
Além das centenas de fotos da mágica Chicago, Vivian tinha muitas fotos de outras cidades, principalmente New York.
Mas o mais curioso é que havia fotos de outros lugares do mundo e durante a pesquisa que levou à “Finding Vivian Maier”, Maloof descobriu que em 1959 a babá-fotógrafa pegou um navio em Los Angeles rumo à Manila, nas Filipinas e passou 6 meses dando uma volta ao mundo. Sozinha. Em 1959, repito.
Nessa viagem longa, Vivian visitou vários países da Ásia, como Hong Kong, Singapura, China, Tailândia, Vietnã, Índia e ainda fez uma pausa no Líbano, Egito e Turquia para seguir para Itália e Grécia e depois voltar para os Estados Unidos.
A cada descoberta da fotografia oculta de Vivian Maier tenho mais vontade de abraçar essa mulher!
E mais, antes disso ela visitou Cuba, Canadá e França, sempre fotografando, sempre registrando as ruas e as pessoas.
Metia a Rolleiflex no pescoço e saia por ai, fazendo fotografia de rua e de viagem, celebrando a vida livre e transformando o que via em arte.
Enfim, quando Maloof encontrou as fotos, descobriu que Vivian Maier praticamente não existia. Não havia referências à ela em lugar algum, um milagre nos idos de 2000. Ela parece ter deixado esse mundo como sempre gostou de viver: indecifrável, anônima e não sei o que pensaria dessa devassa que fizeram na história e nas imagens dela.
Mas o que mais me surpreende é a nota fúnebre que Maloof encontrou e que o levou às poucas informações sobre sua vida: “Sua mente aberta tocou a todos que a conheceram. Sempre pronta a dar sua opinião, um conselho, uma ajuda.”
Diva que fala, né? Salve Vivian Maier!
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